Templo Caboclo Pantera Negra

O tal do Vodu (Vudu, Voodoo) Gnóstico

Por Mario Filho

 

Essa é uma mensagem que escrevi a um Irmão que me questionava sobre as práticas do Vodu (Vudu, Voodoo) Gnóstico, que é baseado no livro de Michael P. Bertiaux, The Voudon Gnostic Workbook (1988), relançado por Weiser em 2007.

 

Caro Irmão,

 

Olha, na verdade não gosto das práticas do Voodoo Gnóstico, Umbanda Esotérica, Umbanda Gnóstica etc. Aprendi, com o tempo, que são adaptações que foram feitas sem critério nenhum. Essa licenciosidade que foi dada ao “mercado religioso” é, em minha opinião, e fazendo eco a René Guénon, práticas da Contra-Iniciação.

 

Sou tradicionalista e, por isso, penso da seguinte forma: as coisas devem ser realizadas dentro de cada tradição. Não basta mudarmos os nomes dos seres nos rituais, é preciso que saibamos muito bem com quem ou o com o quê estamos lidando.

 

Essas misturas (ou hibridismo, bricolage, amalgamento etc) foram feitas, forçosamente, pelos ocultistas, mormente os que foram influenciados por Crowley, que, em minha opinião, não é exemplo iniciático para ninguém. A história contada por Bertiaux a respeito de Jean-Maine há algum tempo está sendo questionada. É só olharmos a importância que a Magia Sexual tem no contexto dos livros de Bertiaux sobre a OTOA (Ordo Templi Orientis Antiqua), M7R (Monastério dos Sete Raios) e LCN (La Couleuvre Noire). Essa importância não existe em nenhuma prática africana tradicional, pois para os africanos o sexo não é tabu, como o é para o ocidental de formação judaico-cristã. Na tradição afro o sexo faz parte da vida.

 

Outra observação é que os rituais que normalmente se repetem (Cruz Cabalística, fechamento do círculo mágico, invocação de forças nos quadrantes etc) são cópias e/ou adaptações dos rituais da Golden Dawn.

 

Quando se trabalha com seres angélicos (Miguel, Rafael, Uriel etc) a coisa é fácil, pois eles são seres sem livre-arbítrio, portanto não podem nos prejudicar. Ao se trabalhar com outras potências não é assim. Esses seres deverão ser chamados dentro de um contexto com o qual já estão acostumados, que lhes seja familiar. Se não for assim eles não serão tão amigáveis como se espera deles. Se dermos sorte eles simplesmente nos ignorarão, porém pode não ser assim. Por exemplo, há seres na tradição Yorubá, que são chamados de Ajogun, os quais não apreciam os seres humanos. Eles podem ser manipulados por um Sacerdote que deverá ser uma sumidade em conhecimentos de ervas, rezas, oferendas etc para poder manipulá-los, sob pena de ficar doente ou vir a ser morto pelos Ajogun no caso de não saber como lidar com eles.

 

Recomendação de ordem prática que posso lhe dar é procurar fazer as coisas dentro de seu conhecimento. Se não sabe, não faça! Se não conhece o ser que está invocando/evocando não o chame! Se quiser enveredar pelo caminho dos Vodun, Inkice ou Orixá deverá estar sob a tutela de um Vodunon, Tata ti Inkice ou Babalorixá, não dá para ser diferente!

 

Eu, por exemplo, há anos, não faço nenhum tipo de prática adaptada, a não ser que ela esteja num contexto específico da tradição com a qual estou trabalhando. É por isso que damos tanta importância ao Ifaísmo (para os Yorubá) ou Faísmo (para os Fon, de onde veio o Voodoo), pois são práticas tradicionais.

 

Por mais que os espanhóis queiram tirar o Michael Bertiaux da jogada, dizendo que a NOTO (Novus Ordo Templi Orientis) ou a OTOA Latina (Ordo Templi Orientis Antiqua Latina) é um “revival” da tradição gnóstica original de Jean Maine, isso não se sustenta. Ao comparar o material disponível da NOTO ou OTOA Latina com os ensinamentos originais do Bertiaux, veremos que são idênticos. Nem as vírgulas foram mudadas. É por isso que Bertiaux e Courtney Willis processaram L.. Para evitar problemas a OTOA Latina foi fechada. Agora eu lhe pergunto: um sistema mágico, baseado quase que exclusivamente em práticas de magia sexual, notadamente as práticas homossexuais, é confiável? Em minha opinião, não! Se fosse uma prática tântrica, exclusivamente baseada no hinduismo, ótimo, estaria tudo bem. Ao misturá-la com o panteão Voodoo o negócio fica diferente.

 

Courtney Willis, Supremo e Absoluto Grão Mestre da OTOA, que não é bobo nem nada, se iniciou em Ifá e está estudando, verdadeiramente, a tradição a qual se ligou. Se não me engano ele foi, no ano passado (2010), para a Nigéria e para o Benin para se iniciar lá. O Benin é o país onde a prática do Voodoo nasceu.

 

Caro Irmão, é necessário que estejamos atentos com a contra-iniciação. René Guénon e os demais tradicionalistas sempre foram unânimes em nos alertar sobre isso. Tive muitas experiências desagradáveis com minhas práticas, acreditando que elas eram para minha melhora. Como disse anteriormente fui vítima. Não gostaria que ninguém mais o fosse!

 

Tenho muito carinho e apreço pelos Irmãos que foram ou são membros das Ordens Martinistas, por isso faço esse alerta. Não sou dono da verdade, ao contrário! Apenas sou bom observador. Olho as pessoas que estão há mais tempo do que eu nesse caminho e vejo como elas estão hoje. A maioria abandonou essas práticas.

 

Você pode fazer as práticas da OTOA e da LCN? Claro que pode, elas são bacanas. No entanto, elas precisam estar inseridas num contexto afro. É necessário que se use gin, as pembas, as oferendas, as invocações etc. Só assim, em minha opinião, é possível abrir os portais de comunicação entre nós e o mundo dos espíritos.

 

Grande abraço

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